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Brasil em perspectiva: dinâmica política, transição e eleições de 2018*

6 de dezembro de 2016

Brasil em perspectiva: dinâmica política, transição e eleições de 2018*

*Artigo de Marcos Campos, fundador e Diretor Executivo da RAPS e professor universitário.
Os debates mais recentes sobre as crises enfrentadas pelo Brasil – econômica, política e social – têm se dedicado a investigar e identificar os fatores relevantes que ajudariam a explicar a dinâmica política e os sucessivos passos atrás que o País parece dar em diversas áreas. Nos últimos dez meses vivenciamos um intenso período de radicalização política com o desenrolar do processo de impeachment de Dilma, início do governo Temer e a realização das eleições municipais. As diferentes interpretações existentes decorrem da pluralidade de perspectivas teóricas e metodológicas e das múltiplas visões e narrativas sobre a história recente. Se há divergências sobre o passado, mais ainda sobre a construção de cenários futuros. Assumindo estes desafios e limitações, o objetivo deste artigo é contribuir com o debate e propor, de forma não pretensiosa e certamente incompleta: (i) a identificação dos principais fatores que afetam ou influenciam de forma relevante o funcionamento do sistema político do país, (ii) uma avaliação e análise de conjuntura da política brasileira e (iii) os prováveis elementos e tendências no horizonte próximo de 2017/18.
A dinâmica política do Brasil e dos demais países da América Latina parece indicar o início de um novo ciclo político com a ascensão de governos de centro e centro direita, nitidamente alinhados com políticas pró-mercado e com ênfase na responsabilidade fiscal. O fim da hegemonia de governos de centro-esquerda pelo continente – Brasil, Argentina, Peru, Guatemala e Paraguai – parece vincular-se, entre outras causas, aos efeitos gerais do desaquecimento das economias centrais no rastro da crise econômica de 2008. Se por um lado esse movimento para governos com foco no equilíbrio fiscal e pró-mercado reforça a hipótese de que há causas econômicas comuns e determinantes afetando os países da região, por outro a aparente sincronia do ciclo político não identifica nem explica adequadamente quais são os fatores específicos que afetaram o sistema político brasileiro, muito menos como chegamos ao desarranjo fiscal, econômico, político e institucional atual. Com recursos orçamentários escassos em decorrência do desaquecimento da atividade econômica e da impossibilidade prática e política de aumento dos tributos, os governos da região, e o Brasil em particular, serão obrigados a redesenhar e fazer cortes profundos em sua estrutura funcional, rever os gastos sociais e políticas de seguridade social e encontrar novos mecanismos de financiamento dos projetos indispensáveis de infraestrutura.
Embora sejam inegáveis os avanços econômicos e sociais que ocorreram no Brasil desde a redemocratização, em 1988, as escolhas e decisões de nossas lideranças políticas, ou a falta delas, legaram uma governança política crescentemente disfuncional, traduzida hoje em impasse político com esgotamento do presidencialismo de coalizão, hiperfragmentação dos partidos transformados em instrumentos de projetos de poder e de barganha, regulação invasiva e sem estratégia – incapaz de estimular o investimento, o empreendedorismo e o crescimento – e um Estado com graves problemas de inchaço e inépcia, que não consegue estruturar serviços públicos básicos de qualidade. As características do sistema político e as fragilidades que marcaram o surgimento da Nova República ajudam a explicar, se não para onde estamos indo, ao menos de onde viemos. A transição para um regime democrático sem ruptura completa em relação ao regime anterior (eleições via colégio eleitoral) significou a construção do novo sistema político via acomodação de novas e antigas forças por meio de concessões de ambos os lados. Mais grave, a Constituição de 1988, excessivamente detalhada, encampou as distorções introduzidas no sistema político pelo regime militar em 1977 (aumento do número de deputados e senadores), criando as bases atuais.
O Brasil vivenciou o chamado “milagre do crescimento” financiado pelos petrodólares que inundaram a região. O regime militar brasileiro aumentou os gastos públicos no contexto de um projeto nacional desenvolvimentista e irrigou surtos de crescimento imobiliário gerando a sensação de bem-estar social e, consequente, legitimação política. A bonança de crédito acabou no início da década de 80 com o brusco aumento das taxas de juros nos Estados Unidos com o objetivo de conter a inflação em ascensão. Com a economia americana em recessão, os preços das commodities despencaram e o fluxo de capitais secou. Como a política econômica do regime autoritário estava calcada em medidas expansionistas – assentadas no modelo de substituição das importações num período de crise econômica mundial devido ao choque do petróleo – acentuaram-se os desequilíbrios internos, legando um cenário de hiperinflação, crise da dívida, mudanças de moedas e experimentalismos que provocaram instabilidade nos mercados e na confiança dos investidores e no poder de compra dos cidadãos ao longo do período. Chega-se assim ao início da década perdida com estagnação e depressão econômica, crises monetárias e bancárias, falências e contração dos mercados.
A transição política do governo militar para os civis em 1985 dar-se-ia num quadro de crescente insatisfação social e incertezas quanto ao futuro do País e caminho de desenvolvimento econômico escolhido. Embora uma nova ordem econômica e política liberal já estivesse em franca ascensão nos Estados Unidos, de Reagan, e no Reino Unido, de Thatcher, a dinâmica política no Brasil do final da década de 80 centrava-se na polarização entre uma nova esquerda ascendente, que unia trabalhadores e lideranças históricas, e um campo político de centro e liberal. O fim melancólico do governo Sarney (1985-89) e a vitória eleitoral de Collor na eleição presidencial de 1989 ocorreria já sob o impacto da queda do Muro de Berlim, e seu efeito para o leste europeu, e da solução do Plano Brady para a crise da dívida do País. O alívio da dívida teria como contrapartida reformas econômicas propugnadas pelo novo receituário em construção, o Consenso de Washington: disciplina fiscal, privatização, estabilidade de preços, liberalização do comércio exterior e financeira e desregulamentação.
O País inicia a década de 90 tendo como prioridade máxima vencer a inflação e suas distorções por toda a economia. O primeiro governo civil eleito diretamente em 1989 deu início a uma agenda econômica alinhada ao novo credo liberal. A abertura comercial e econômica e a modernização do Estado brasileiro significariam uma ruptura com a agenda nacional desenvolvimentista anterior de substituição de importações, ativismo e intervenção estatal e forte regulação dos mercados. Os sobressaltos políticos e a baixa performance econômica logo levariam ao impeachment de Collor e ao governo de transição de Itamar. Construía-se um consenso entre as principais forças políticas sobre a necessidade de alinhar o País aos novos paradigmas de desenvolvimento e para tal era fundamental vencer a inflação, principal desafio nacional, garantir o processo democrático e adotar políticas econômicas sensatas e confiáveis. O nacional desenvolvimentismo passava a ser uma página virada e as condições macroeconômicas necessárias ao novo modelo de desenvolvimento precisavam ser construídas e consolidadas. Nesse contexto, a implementação do Plano Real por Fernando Henrique Cardoso (FHC), como ministro da fazenda do governo Itamar, o credenciaria como vencedor das eleições de 1994 em primeiro turno. O governo FHC1 buscou a estabilização macroeconômica, privatizações e o início da modernização do Estado, mas seria fortemente atingido pelas crises econômicas da Ásia (1997) e da Rússia (1998). Estas crises ganharam força mundo afora e seus efeitos cambiais resultaram na queda da taxa de crescimento nacional, aumento do desemprego e da dívida pública. Mesmo com a popularidade em queda, FHC seria reconduzido à presidência em 1998 e aprofundaria a agenda liberal e a adoção de políticas fiscais mais agressivas, com mais privatizações, equacionamento das dívidas dos Estados e aprovação da lei de responsabilidade fiscal.
A década de 2000 iniciou com crescente mal-estar econômico e insatisfação social com o governo de centro e pró-mercado. O governo FHC, desgastado pelo fraco desempenho da economia e pela crise energética, não faria seu sucessor. Seu maior opositor, Lula, após três tentativas, seria eleito em 2002 com mais de 53 milhões de votos. O novo governo de centro-esquerda manteria inicialmente os compromissos de disciplina fiscal, baixa inflação, abertura dos mercados e comprometia-se a promover uma política de distribuição de renda. Mais uma vez, os preços elevados das commodities e a grande liquidez internacional e os juros negativos praticados nos países desenvolvidos alimentariam o novo “boom” econômico e as políticas redistributivas prometidas. Somados, fatores internos e externos embalaram o interesse e a euforia dos mercados internacionais, que passaram a considerar que o País finalmente encontrara “novos rumos” e, esperava-se, o caminho para o desenvolvimento. Eleito em 2002 e reeleito em 2006, Lula, até então refratário aos escândalos que envolviam seu nome, manteve a política macroeconômica ortodoxa de FHC, avançou nas políticas sociais, apostou no populismo cambial como elemento disciplinador da inflação e, em face à crise de 2008, adotou medidas fiscais expansionistas e ativismo econômico. Com a economia anabolizada crescendo 7.5% em 2010 e com a aprovação de 85% da população, elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff.
Do ponto de vista econômico, os anos iniciados em 2010 foram marcados por uma redobrada aposta na fórmula de expansionismo fiscal, dirigismo e intervencionismo econômico. O plano de desenvolvimento econômico voluntarista, experimentado no segundo mandato de Lula e no primeiro mandato de Dilma, concebido, justificado e implementado no bojo e rastro da crise econômica mundial de 2008, engendrou a ressurreição do nacional-desenvolvimentismo – exemplificado na tentativa de criação dos campeões nacionais, obrigatoriedade de conteúdo nacional na produção de bens industriais, forte participação dos bancos públicos na oferta de crédito, regulação das indústrias de gás e petróleo, forte participação de investimentos públicos no setor de energia, estruturação de consórcios de grandes empreiteiras para a construção de usinas hidroelétricas e para o setor de defesa nacional, entre outras medidas.
A pretensão de domar ou reinventar o capitalismo brasileiro e os interesses do capital internacional fracassou espetacularmente sob a égide do exacerbado dirigismo governamental. Seja por erros grosseiros de concepção, seja por falta de base política e social de apoio, o fracasso do experimento voluntarista e populista do governo do PT revelou os limites e a incapacidade do pensamento progressista em entender os efeitos do desaquecimento da economia brasileira e latino-americana como consequência da crise econômica de 2008, do custo do resgate do sistema financeiro internacional, da consequente crise da dívida europeia, da desaceleração da economia chinesa, do colapso dos preços das commodities e da evasão do capital dos mercados emergentes em busca de refúgio de ativos seguros nos países desenvolvidos, especialmente os Estados Unidos.
O ocaso do governo Dilma revela a redução do grau de liberdade das lideranças brasileiras em sua capacidade de construir uma trajetória nacional específica e soberana de desenvolvimento. Revela também sua dificuldade em reconhecer as consequências desastrosas de políticas fiscais irresponsáveis e as causas econômicas que permitiram o surto de prosperidade. De qualquer forma, o choque da nova realidade socioeconômica levou os cidadãos a sair às ruas para protestar. A fórmula de crescimento anabolizada pela manutenção e ampliação de uma política expansionista e dirigismo e ativismo econômico garantiu a vitória nas eleições municipais de 2012 e crescimento econômico positivo até 2013, embora, a partir de junho desse ano, irromperam insatisfações sociais com a baixa qualidade dos serviços públicos e com a governança do país. Atônitos, as lideranças políticas foram incapazes de oferecer as respostas. A crise perfeita se armava. O desembarque do PSB do governo e a construção de uma candidatura alternativa às eleições presidenciais com Eduardo Campos (Marina Silva) sinalizava o acirramento da disputa de poder e um começo de ruptura da bipolaridade PT e PSDB. A reeleição de Dilma/Temer em 2014 por pequena margem de votos, o questionamento dos resultados das eleições no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a brusca mudança no sentido da política econômica com medidas de ajuste fiscal (Joaquim Levy), o aprofundamento das crises política, econômica e social e o início e desfecho do processo de impeachment, marcariam um período conturbado da política do País até o início do governo de transição de Temer em maio de 2016.
O colapso do governo Dilma2 mostrou ao País que nossas lideranças políticas falharam não apenas em sua tarefa básica de encontrar soluções e fazer o governo funcionar, mas em sua capacidade de formular um projeto ou mesmo uma visão de País. O custo dos erros dos governos Lula2 e Dilma 1 e 2 será contabilizado em anos de perdas e oportunidades de crescimento, e, mais relevante, solapará o pacto social e político em torno de conquistas essenciais obtidas com a redemocratização (garantia de plena democracia), estabilidade monetária (controle da inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal) e avanços sociais (programas sociais). A conjugação de fatores como o colapso fiscal e administrativo dos governos estaduais, mergulho recessivo, alta da inflação, desemprego, recuo das políticas de proteção social, prisão e persecução criminal de empresários e lideranças políticas pela Lava Jato fragilizou e instabilizou o sistema político e a própria democracia, colocou em xeque o pacto político da Nova República e trouxe elementos de incerteza quanto aos rumos do País.
É nesse contexto de profunda crise que tem início o governo Temer em maio de 2016. Ancorado numa ampla base política de sustentação no Congresso Nacional, agora acrescida da antiga oposição ao governo Dilma (PSDB, DEM e PPS), o novo governo busca retomar o protagonismo ao propor uma agenda com foco na reorganização fiscal do governo federal, na recuperação das empresas e bancos públicos e na reorientação econômica do País. Apresentou desde maio inúmeras propostas: adoção por 20 anos de um teto para os gastos públicos (PEC 241), congelamento de nomeações para as empresas estatais, prorrogação da desvinculação das receitas da União (DRU, PEC 04/15), reforma do ensino médio (MP 746), alteração da meta fiscal de 2016 para 170,5 bilhões (Lei 13.291), renegociação das dívidas dos Estados e Municípios com a União em R$ 50 bilhões (PLP 257), mudanças nas regras de exploração do pré-sal, prorrogação das licitações das concessões de infraestrutura (MP 752/16), entre outras.
As duas propostas, o novo regime fiscal no País (PEC 241/16), aprovado na Câmara dos Deputados e aprovado, em 29/11, em primeiro turno no Senado (PEC 55/16), e a reforma da previdência social, representam o coração da agenda econômica e fiscal. Aprovadas, estas medidas resultarão na redução do tamanho relativo do Estado e do alcance de políticas sociais, afetando o centro do pacto político e social da Constituição de 1988. Ousada e liberal, a agenda proposta pelo governo Temer representa mudança histórica radical na formação da poupança nacional, no redesenho dos governos e de políticas públicas como o sistema de solidariedade social (previdência social, saúde pública e assistência social). Avançando esta agenda, outro pacto social e político precisará ser forjado nas eleições de 2018.
Após seis meses do novo governo, as lideranças políticas e empresariais do País parecem concordar que os prognósticos iniciais otimistas com o governo Temer não estão se materializando. Persiste a recessão num quadro incertezas políticas e dificuldades na apresentação e aprovação de medidas do ajuste fiscal. Ao apostar na implantação de uma política fiscal expansionista (déficit de 170 bilhões em 2016), o governo procurou, sem aumento de impostos, acertar as contas e passivos e acomodar gastos considerados politicamente sensíveis (aumento do funcionalismo), em busca de uma retomada econômica no último trimestre de 2016 e em 2017. O gradualismo na busca do equilíbrio fiscal já começa a despertar críticas sobre a estratégia, sobrecarregando a política monetária do Banco Central. O fato é que o atual pacto de transição e de apoio a Temer se fragiliza. A população já entendeu que o ônus maior da crise econômica recaiu na desvalorização do poder de compra dos salários, via inflação, mas ainda não ficou claro o alcance dos cortes de gastos na área social. As manifestações de junho de 2013 indicam sinais de mobilização e oposição ao colapso dos serviços públicos. A calmaria dos mercados e os sinais de confiança de consumidores e empresários na recuperação econômica representam um voto de confiança cuja sustentação ficará comprometida tão logo as empresas endividadas não encontrem demanda para seus estoques e os investidores, inseguros quanto ao futuro, mudem suas apostas.
Quanto às eleições de 2016, algumas mensagens dos eleitores podem ser identificadas. Primeira, forte reação e punição ao PT como demonstra o encolhimento das prefeituras (638 para 254) e eleitores sob administração de seus prefeitos. Segunda, fortalecimento do PSDB, cujo crescimento em número de prefeituras foi da ordem de 15.5%. Terceira, fim da bipolarização política dos últimos vinte anos entre PT e PSDB. Quarta, enfraquecimento do campo de esquerda e centro esquerda. Quinta, fortalecimento de um campo político de direita, especialmente no Rio de Janeiro. Sexta, o crescimento de partidos de centro e centro-direita indica que se a atual coalizão ou base de apoio ao governo Temer (PMDB, PSDB, PSB, PSD, PPS, PRB, PR, DEM, PP, PTB, PROS, PSC, SD, PEN, PTN, PHS, PSL, totalizando 278 deputados) conseguir bons resultados em termos de recuperação econômica, o eleitorado poderá apoiar nas urnas um candidato da continuidade. Sétima, diferente do que tem se propagado em relação às abstenções, número de votos branco e nulos, o eleitor tem comparecido às urnas tanto quanto nas eleições anteriores apesar do descontentamento em relação aos políticos e partidos.
Quanto à análise e construção de prováveis cenários futuros, especialmente para as eleições de 2018 e além, é fundamental destacar que a crise vivenciada pela democracia representativa no Brasil e no mundo tem seu cerne no descompasso entre as aspirações da população e a capacidade das instituições políticas de endereçar e responder às exigências e demandas coletivas. As crescentes expectativas estão diretamente associadas à emergência do protagonismo dos indivíduos nas esferas públicas e privadas.
Até a década de 1960 as aspirações e reivindicações da sociedade eram legitimamente processadas pelas instituições políticas e as pessoas se sentiam representadas e atendidas pela ação governamental. Esta estabilidade social apoiava-se na presença de governos nacionais fortes, rígida regulação econômica da economia e dos mercados e numa estrutura de representação social. A irrupção de uma série de reivindicações, nos Estados Unidos e na Europa, contra esses valores, contra as autoridades estabelecidas e em defesa da liberdade de escolha de seu próprio modo de vida daria o início de um novo período marcado por um espírito reivindicativo e de rebeldia que provocaria mudanças culturais, sociais e políticas profundas nas sociedades desenvolvidas e influenciaria uma geração de jovens criativos e inovadores que lançaria a revolução tecnológica nas comunicações abrindo o caminho para um mundo cada vez mais globalizado. Estas inovações tecnológicas, especialmente nas novas formas de comunicação eletrônica, permitiam o compartilhamento e a conectividade das pessoas cada vez mais capazes para agir individualmente e influenciar a sociedade. O encurtamento do tempo e do espaço influenciaria a economia, a sociedade e a cultura e a política e abriria o caminho para uma nova esfera pública ancorada nos novos sistemas de comunicação (redes sociais) em substituição da esfera pública mediada pelas instituições políticas tradicionais. O impacto desse processo – novas tecnologias, conectividade e emergência de uma cidadania global – seria devastador: sistemas políticos fechados ruiriam (URSS) e a integração global dos mercados se aceleraria com o fortalecimento das empresas globais em detrimento dos Estados nacionais.
A globalização, ao permitir o maior fluxo de bens, capitais e pessoas, reduz o poder dos Estados nacionais e, ao estimular o fluxo de informações, ideias e valores, fortalece o indivíduo. Os Estados nacionais impotentes e incapazes de garantir segurança e estabilidade em face de crises e ameaças globais são confrontados por cidadãos cada vez mais ativos participativos não apenas em temas de sua cidade e região como também em temas globais, tais como os direitos humanos e a proteção ambiental. Com voz e influencia, a cidadania emergente entrelaça o local e o global e se choca com a democracia representativa restrita ao espaço nacional. Problemas globais exigem respostas globais. O fracasso dos governantes em antecipar a crise de 2008 e de proteger suas populações mostrou os limites dos Estados nacionais, embora a resposta coordenada destes tenha sido suficiente para amenizar o colapso financeiro global.
É nesse contexto de profundas transformações provocadas pelas inovações tecnológicas (redes sociais) nos indivíduos, sociedade e instituições que se deve refletir sobre a dinâmica da política brasileira. Uma primeira conclusão é de que crise da democracia representativa irá aumentar no País, com demandas por maior participação direta pela população. É inegável que vida partidária está bloqueada à participação e discussão de novos atores, sem espaços de debate sobre a política e as políticas públicas.
Em segundo lugar, a despeito de certo desgaste na mídia, Lula continua figurando como protagonista das intenções de votos para eleições 2018, mas há dúvidas se será capaz de escapar das consequências da Lava Jato. O encolhimento do PT, testemunhado nas eleições municipais, possivelmente levará ao fim da bipolarização com o seu principal adversário, PSDB, aumentando a fragmentação partidária e a possibilidade de novos protagonistas na campanha presidencial de 2018.
Em terceiro, com o fim da bipolarização, haverá uma reorganização dos diferentes campos políticos e um acirramento da disputa entre partidos por uma possível candidatura à frente. Nesse sentido, a recente reforma política que tramita no Senado Federal tem justamente como objetivo limitar o potencial de disputa e atuação, na arena legislativa, dos partidos considerados pequenos.
Em quarto, a dinâmica de 2018 encontra-se ancorada também no desempenho econômico do Governo Temer – cujas dificuldades não são pequenas e já foram apontadas anteriormente – em sua capacidade de aprovar a agenda de reformas atualmente em discussão, no suporte de grupos empresariais e no desempenho na entrega de serviços públicos aos cidadãos, ameaçado pelas dificuldades de gestão das prefeituras e governos estaduais.
Por último, os desdobramentos da Operação Lava Jato – que já instaurou até o momento mais de 1.397 procedimentos – são incertos e podem atingir diretamente políticos do governo e de sua base, gerando instabilidade e comprometendo não somente suas principais figuras, mas novamente a capacidade do sistema político de dar resposta às demandas da sociedade.
Considerados estes elementos em seu conjunto, é razoável supor que a travessia até 2018 exige um debate franco, direto e claro sobre propostas para a agenda de desenvolvimento do Brasil e não de mais ilusões. Provavelmente teremos novamente uma eleição aberta com a presença de vários candidatos com potencial de disputar o direito de ingresso no segundo turno das eleições.

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